PERGUNTAS DE JOAQUIM BRANCO / RESPOSTAS DE WLADEMIR DIAS-PINO
Wlademir Dias-Pino[1968]


1 – O poema-processo resolve o problema da atual poesia brasileira ou apenas desata o nó concretista?
     – O nosso movimento nada tem que ver, como continuidade, com a poesia brasileira (literatura); por isso, recusa, conscientemente, o nome de poesia (estado espiritual) para firmar o de poema (físico) /processo. Ele é uma ruptura.#capa# Esta é a nossa radicalidade. Assim é que a rasgação foi nosso primeiro poema coletivo. Nossa demonstração pública: acrobacia-poema. O fim da poesia modernista, que começou com o verso branco (Mário de Andrade), continuou com a perda da pontuação como elemento divisor do verso (Adalgisa Nery, por exemplo), continuou contra a adjetivação, pela valorização do substantivo (Murilo Mendes), e do verbo (Drummond), para chegar à leitura de estrutura (João Cabral). A estruturação do verso pela gramática daria nisso.
    Assim é que a poesia modernista girou em torno da palavra, até mesmo usando-a em estado de dicionário, e nós acentuamos, agora, que o que nos interessa é o projeto do poema. A palavra passa a ser dispensada; nem existe diferença entre a pintura e o poema. A poesia modernista era um problema de língua e o do nosso poema é de linguagem.


2 – Como a imprensa especializada tem visto este movimento novo? Há boicote?
    – Talvez exista uma imprensa especializada em literatura, mas o que ela poderia falar sobre um conceito novo de poema? Ou melhor, de uma ruptura. Quer ver só: os quatro poetas principais e vivos do modernismo (Bandeira, Drummond, Cassiano e Murilo Mendes) fizeram e fazem experiências com a estrutura, mas jamais chegarão ao processo. A rasgação não foi uma promoção, mas uma conscientização pública.
    Não é a toa que João Cabral é um ponto final e uma síntese de Drummond com Murilo. Isto tudo mostra que somos uma ruptura mesmo. O modernismo acabou de vez. Volto a dizer que fomos demonstrá-la em público porque a nossa luta é de rua.
    Os donos dos meios de informações, na verdade, nem tem noção do que queremos e ainda não se refizeram do susto da escadaria do Municipal.


3 – Explique a posição de vocês em relação às outras vanguardas? Como coexistência, convívio ou antagonismo?
    – A nossa oposição é do polegar com relação aos outros dedos da mão.


4 – A palavra está superada no poema?
   – Sim e completamente! A palavra no poema/processo só tem duas funções:
•    didática: para a aprendizagem do poema;
•    código: retardador (leitura mecânica do cérebro humano) para uma informação geometrizada (eletrônica).


5 – Você, que participou da poesia concreta na época de eclosão do movimento, acha que a reformulação constante de teorias é coisa imprescindível ao poeta de vanguarda?
    – O poema modernista é simbolista, compara. Já o poema/processo, relativa. O poema se auto-supera em cada versão. O relativo é a própria criatividade da abertura. A função do poema é tornar a teoria redundante, até que restem as contradições vivas como nova abertura. As teorias como salvados do incêndio acabam mais remendadas que a Constituição do Brasil.



6 – No aspecto participante, o poema/processo abre mais o parâmetro da comunicação popular?
   – O poema/processo é uma abertura constante: criação/teoria. Desde a reformulação das manchetes diárias nos jornais (colagens), isto como cultura de massa, até seu nível mais elevado, inauguração de processos informacionais. Individualmente o consumidor manipula o poema com suas opções corporais e coletivamente se apropria dos processos políticos e sociais, pela divulgação dos fatos.
    Dizendo que só é critério, para julgamento de um poema, a sua funcionalidade, isto é: só o consumo é lógica (e não lógico), defende um princípio socializante.


Revista Ponto 2
, Rio de Janeiro, Ponto, 1968.